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Pela primeira vez, astrônomos observaram colisões massivas de corpos celestes fora do Sistema Solar, oferecendo uma janela para o nascimento de planetas.
Uma equipe de cientistas foi agraciada com uma visão sem precedentes dos primórdios de sistemas estelares, ao detectarem as primeiras colisões entre grandes objetos celestes ocorrendo fora da nossa vizinhança local.

Esses eventos espetaculares, observados em 2004 e 2023, aconteceram na órbita da jovem estrela Fomalhaut, localizada a apenas 25 anos-luz de distância. Liderado por Paul Kalas, pesquisador da Universidade da Califórnia em Berkeley, EUA, o estudo foi publicado nesta quinta-feira (18) na revista Science, oferecendo uma janela inestimável para compreender as condições violentas e dinâmicas sob as quais planetas como a Terra se formaram há bilhões de anos.
Em resumo:
- A estrela Fomalhaut, com apenas 440 milhões de anos, serve como um laboratório natural para estudar a fase inicial e turbulenta da formação planetária;
- Colisões entre planetesimais (objetos menores que planetas, formados por rocha e gelo, comuns em sistemas planetários jovens) em 2004 e 2023 foram as primeiras do tipo a serem diretamente testemunhadas em um sistema estelar distante;
- Cada um dos objetos colididos tinha um diâmetro de pelo menos 60 km, quatro vezes maior que o asteroide responsável pela extinção dos dinossauros na Terra;
- A pesquisa revelou que um objeto anteriormente identificado como um exoplaneta, “Fomalhaut b”, era na verdade uma nuvem de poeira gerada por um desses impactos massivos.
O Sistema Fomalhaut é um caldeirão cósmico, com relativamente pouca idade (440 milhões de anos, em comparação com os 4,6 bilhões de anos do nosso Sol), o que indica que processos intensos de formação planetária ainda estão em andamento.
Em ambientes assim, rochas, asteroides e planetesimais colidem constantemente. Embora muitos ricocheteiem, alguns se unem, aglomerando poeira e gelo para eventualmente formar planetas e luas. No entanto, colisões de grande escala, como as recém-observadas, são eventos raros, ocorrendo talvez a cada 100 mil anos em um período de centenas de milhões de anos.

Para Kalas, testemunhar esses eventos é como “olhar para o passado, para aquele período violento do nosso sistema solar, quando ele tinha menos de um bilhão de anos”. Ele explica em um comunicado que a equipe não viu os objetos colidindo diretamente, mas sim as imensas nuvens de poeira resultantes dos impactos, que começam a refletir a luz da estrela hospedeira.
Investigando Fomalhaut desde 1993, inicialmente o time identificou um ponto brilhante em seu disco protoplanetário em 2008, que foi erroneamente classificado como um planeta, Fomalhaut b. A nova análise, no entanto, reclassifica Fomalhaut b como uma nuvem de detritos em expansão. Kalas ressalta a natureza enganosa desses fenômenos. “Este é um fenômeno novo, uma fonte pontual que aparece em um sistema planetário e depois desaparece lentamente ao longo de 10 anos ou mais. Ela se disfarça de planeta porque os planetas também se parecem com pequenos pontos orbitando estrelas próximas.”
Leia mais:
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Magnitude das colisões cósmicas é impressionante
Os corpos que se chocaram eram gigantes, acima de seis mil metros de diâmetro, superando em pelo menos quatro vezes o tamanho do asteroide de Chicxulub, que provocou a extinção em massa dos dinossauros na Terra.
De acordo com o coautor Mark Wyatt, pesquisador da Universidade de Cambridge, na Inglaterra, “o sistema Fomalhaut é um laboratório natural para investigar como os planetesimais se comportam ao sofrerem colisões, o que, por sua vez, nos informa sobre sua composição e formação”. Ele acrescenta que esta observação permitiu estimar a existência de cerca de 300 milhões de planetesimais na região ao redor da estrela.
A detecção de monóxido de carbono no sistema Fomalhaut sugere que esses objetos são ricos em voláteis (substâncias que se transformam em gás facilmente em baixas temperaturas) tornando-os semelhantes aos cometas gélidos do Sistema Solar.
A nuvem de poeira de 2023, que já está 30% mais brilhante que a de 2004, continuará a ser monitorada. Para isso, os pesquisadores planejam combinar as capacidades do Hubble com a poderosa visão infravermelha do Telescópio Espacial James Webb (JWST), da NASA.
