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“Arquivo de pedra” liga mudanças climáticas à origem da agricultura; entenda

“Arquivo de pedra” liga mudanças climáticas à origem da agricultura; entenda

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Uma estalagmite encontrada em uma caverna no Curdistão forneceu detalhes sem precedentes sobre as condições climáticas locais entre 18 mil e 7,5 mil anos atrás, período em que a Terra emergia da última era glacial. Por sua localização estratégica, próxima aos vales onde a agricultura e as primeiras civilizações floresceram, esta descoberta oferece uma visão profunda dos fatores que impulsionaram seu surgimento.

Estalagmite
Amostra da estalagmite KR19-3 da caverna Hsārok (Imagem: Eleonora Regattieri)

Além disso, as mudanças climáticas reveladas pela estalagmite correspondem às registradas na Groenlândia, demonstrando a influência global no local considerado o berço da humanidade moderna.

Berço da civilização, agricultura e clima antigo

A análise da estalagmite revelou um aumento na pluviosidade na região há aproximadamente 14.560 anos, resultando em uma deposição mais rápida de calcário. Contudo, há cerca de 12,7 mil anos, a precipitação diminuiu e as condições tornaram-se mais empoeiradas, conforme indicado pelo aumento das concentrações de elementos-traço, como bário, estrôncio, zinco e sódio nas camadas de calcário.

A Caverna Hsārok está localizada no interior do Crescente Fértil. Atualmente, a pluviosidade na área é suficiente para a agricultura, e afluentes do Rio Tigre, às margens dos quais floresceram algumas das primeiras civilizações, fluem nas proximidades.

Questão de por que a agricultura teve início exatamente quando e onde ocorreu representa um dos grandes mistérios da história da humanidade (Imagem: Bits And Splits/Shutterstock)

Conexões arqueológicas e mobilidade humana

Evidências arqueológicas sugerem que a Caverna de Palegawra, a 140 quilômetros da Caverna Hsārok, era frequentemente ocupada no verão durante o aquecimento inicial da retração glacial, mas foi amplamente abandonada por volta da época em que a estalagmite indica um período de seca na região. A ocupação tornou-se comum novamente justamente quando a Caverna Hsārok registrava sinais de um novo aquecimento.

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Os autores da pesquisa propõem que, até o início da era Holocena, os contrafortes das Montanhas Zagros “criaram um mosaico de ambientes espacialmente restritos, porém ricos em recursos”.

Embora esses ambientes não fossem adequados para sustentar grandes assentamentos permanentes ao longo do ano, eles incentivaram a mobilidade, permitindo que as pessoas explorassem recursos sazonais em diferentes altitudes e ecótonos, como florestas abertas, pastagens e habitats ribeirinhos.

A flexibilidade de viver sob tais condições, argumentam os autores, promoveu a construção de uma cultura que, uma vez que o clima ficou mais quente e estável, estava bem preparada para aproveitar novas oportunidades, incluindo a agricultura.

Retrato climático global

A leitura de espeleotemas pode, por vezes, produzir quadro conflitante. No entanto, a estalagmite da Caverna Hsārok narra uma história consistente. As proporções de carbono-13 para carbono-12 revelam um crescimento vegetal local mais rápido em períodos que as proporções de oxigênio-16 e -18 sugerem serem mais quentes e úmidos, como seria de se esperar.

Igualmente importante, o cenário se alinha bem com evidências de múltiplos núcleos de gelo da Groenlândia. O período úmido local registrado pela estalagmite coincide com o interstadial Bølling-Allerød, quando a Groenlândia aqueceu significativamente pela primeira vez após o auge da última glaciação.

Período de seca na região, após o aquecimento inicial da retração glacial fez com que fosse abandonada, segundo dados químicos da estalagmite (Imagem: Shutterstock)

A subsequente seca corresponde ao período Younger Dryas, quando a Terra, e particularmente a Bacia do Atlântico Norte, experimentou um resfriamento ainda inexplicado.

A pesquisa foi publicada na revista Proceedings of the National Academy of Sciences.

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