Após vitória nas urnas, Milei ganha fôlego político na Argentina

Surpreendente desempenho do partido “A Liberdade Avança” abre caminho para reformas e reforça base do presidente da Argentina, Javier Milei

A surpreendente vitória do partido “A Liberdade Avança”, de Javier Milei, nas eleições legislativas desse domingo (26/10), coloca a Argentina em um novo momento político. Agora, o líder ultraliberal ganha estabilidade no Legislativo e pode avançar com reformas econômicas e fiscais que enfrentavam resistência.

O pleito, que renovou metade da Câmara dos Deputados e um terço do Senado, transformou-se em um referendo sobre o segundo ano de governo de Milei, marcado por crises econômicas, escândalos de corrupção e tensões com o Congresso. Tal resultado amplia a presença de Milei no Congresso e garante o poder de impedir que vetos presidenciais sejam derrubados.

Foi um dia histórico para a Argentina. O povo argentino resolveu deixar para trás 100 anos de decadência e persistir no caminho da liberdade, do progresso e do crescimento. Hoje começa a construção da Argentina grande”, afirmou Milei em discurso em Buenos Aires, citando ainda que “os argentinos deram um ‘basta ao populismo’. Populismo nunca mais”.

Ao Metrópoles, Priscilla Mendes, doutora em estudos estratégicos da defesa e da segurança, avalia que a vitória do partido de Milei não só reforça o presidente, mas altera a correlação de forças no Congresso.

“Esse sucesso já vinha se desenvolvendo desde 2023. O partido (de Milei) avançou para 101 deputados, enquanto o peronista União pela Pátria perdeu assentos, enfraquecendo sua capacidade de ser protagonista. Isso dá vantagem ao governo, mas também aumenta a responsabilidade, porque o eleitorado espera entregas concretas, não apenas vitória eleitoral”, explicou Mendes.

Cenário político e econômico

A eleição funcionou como um referendo sobre a gestão de Milei, que assumiu a Casa Rosada em dezembro de 2023 com promessas de “refundar o país” e enfrentar crises crônicas na economia.

A vitória também chega após derrotas regionais — incluindo na província de Buenos Aires em setembro —, denúncias de corrupção envolvendo familiares do presidente e um contexto de inflação elevada e desvalorização do peso.

“O aporte financeiro de US$ 20 bilhões oferecido por Donald Trump, aliado à compra de pesos pelo Tesouro americano, renovou a confiança e ajudou a financiar parte da campanha dos candidatos alinhados à Casa Rosada”, analisou Mendes. “Além disso, Milei conta com forte apoio entre os jovens, que buscam uma alternativa ao modelo tradicional peronista”, completa.

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Presidente da Argentina, Javier Milei
Javier Milei

Reformas e poder legislativo

Com o resultado, o partido de Milei alcançou um terço das cadeiras do Congresso, suficiente para barrar vetos e ter mais liberdade para avançar com sua agenda econômica. O presidente já anunciou que pretende implementar reformas tributárias, trabalhistas e medidas de austeridade.

Matheus Marreiro, internacionalista e doutorando em estudos estratégicos pela Universidade Federal Fluminense (UFF), ressalta que a vitória fortalece a capacidade de Milei de aprovar medidas, mas também impõe desafios. “Apesar do crescimento, o partido ainda não detém maioria absoluta. Será necessário negociar com aliados para aprovar leis mais complexas. Estes dois anos até 2027 serão uma janela crucial para consolidar mudanças antes que o cenário político se modifique novamente”, disse.

O socorro de Trump a Milei

O governo norte-americano também se fez presente na comemoração da vitória do argentino. Scott Bessent, secretário do Tesouro dos EUA, parabenizou Milei, destacando a vitória como “um mandato renovado para a mudança” e reafirmando a importância da Argentina como aliada estratégica na América Latina.

Dentro da Casa Rosada, o presidente confirmou que realizará mudanças no Gabinete até dezembro, incluindo a saída de ministros como Luis Petri e Patricia Bullrich, mas mantendo a influência de nomes centrais como a irmã dele, Karina Milei, e o assessor Santiago Caputo, descritos como os “arquitetos” do governo.

“Assim como agradeço a todos os argentinos pelo enorme ato cívico, seria hipócrita se eu não fizesse um agradecimento particular aos que abraçaram as ideias da liberdade”, afirmou Milei. “O resultado é confirmação do mandato que recebemos em 2023. Com o apoio do povo argentino, podemos começar a trabalhar mais profundamente e alcançar resultados nas reformas restantes.”

O caminho à frente

A vitória legislativa deixa claro que a primeira metade do mandato de Milei, marcada por crises e escândalos, dá lugar a uma nova fase. O partido agora tem poder ampliado para implementar reformas, mas também assume a responsabilidade de entregar resultados concretos à população.

A capacidade de aprovar leis, controlar vetos e negociar com aliados será decisiva para a estabilidade política e econômica da Argentina nos próximos dois anos, até a eleição presidencial de 2027.