“Enxofre exótico” em amostras coletadas há décadas na Lua

Pesquisadores descobriram isótopos de “enxofre exótico” nunca vistos na Terra em rochas lunares coletadas pela missão Apollo 17. Esse elemento pode oferecer novas pistas sobre a formação da Lua. A descoberta foi publicada na edição de setembro da revista científica JGR: Planets.

As rochas estudadas vieram da última missão tripulada para a Lua: a Apollo 17, lançada em 1972. Na época, as amostras extraidas pelos astronautas foram seladas e guardadas para o programa Apollo Next Generation Sample Analysis (ANGSA), da NASA.

Mais de 50 anos depois, os compartimentos que guardavam essas rochas lunares foram finalmente abertos — e desde então têm revelado novas descobertas. O Olhar Digital noticiou estudos sobre como esse material pode reescrever a história da Lua e sobre a origem da chamada formação Manto Leve.

Harrison Schmitt foi o primeiro geólogo (e primeiro cientista) a pisar na Lua
Foto do astronauta Harrison Schmitt, integrante da missão Apollo 17 e primeiro geólogo a caminhar na Lua. (Imagem: NASA)

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Enxofre exótico intrigou pesquisadores

No novo estudo, a equipe detectou altas concentrações de enxofre-33 (S33), um isótopo não encontrado na Terra. As quantidades de isótopos servem como “impressões digitais” dos materiais estudados, ou seja, se duas rochas têm a mesma impressão isotópica, elas provavelmente vieram do mesmo lugar.

Os pesquisadores esperavam encontrar um caso parecido com o do oxigênio, cujos isótopos da Terra e da Lua têm ampla semelhança. Mas esse não foi o resultado.

“Antes dessa descoberta, pensava-se que o manto lunar tinha a mesma composição de isótopos de enxofre que o da Terra. Era isso que esperávamos ver ao analisar essas amostras, mas, em vez disso, vimos valores muito diferentes de tudo o que encontramos em nosso planeta”, relatou James Dottin, líder do estudo e professor de ciências da Terra na Universidade de Brown, em um comunicado.

Testemunho de rocha lunar ficou guardado por cinco décadas.
Amostra rocha lunar coletado durante a Apollo 17. A missão trouxe cerca de 110,5 kg de material rochoso para a Terra. (Imagem: Dave Edey and Romy Hanna, UTCT, Jackson School of Geosciences/NASA)

Para as análises, a equipe selecionou rochas vulcânicas expelidas do manto lunar. Segundo Dottin, o grupo esperava encontrar enxofre que tivesse sido expelido junto com o material rochoso, mas o grupo descobriu que ele foi incorporado de outra forma.

“Meu primeiro pensamento foi: ‘caramba, isso não pode estar certo’. Então, voltamos para garantir que tínhamos feito tudo corretamente, e fizemos. Estes resultados são surpreendentes”, comentou o professor.

Origem do enxofre exótico pode estar na formação da Lua

Os pesquisadores apresentaram duas potenciais explicações para o enxofre exótico. Ambas estão relacionadas à origem da Lua.

O material pode ser o remanescente de processos químicos no passado lunar. Frações de S33 são encontradas quando o enxofre interage com a luz ultravioleta em uma atmosfera rarefeita. Há também a hipótese de que a Lua teria tido uma atmosfera de curta duração no início de sua história, o que poderia ter suportado essa radiação e formado os isótopos.

“Isso seria evidência de uma antiga troca de materiais da superfície lunar para o manto. Na Terra, temos placas tectônicas que fazem isso, mas a Lua não tem placas tectônicas. Então, essa ideia de algum tipo de mecanismo de troca na Lua primitiva é empolgante”, disse Dottin.

Simulação da formação da Lua após o impacto do planeta Theia com a Terra há 4,5 bilhões de anos. (Vídeo: Centro de Pesquisa Armes da NASA e Universidade e Durham)

A outra hipótese é de que o S33 seria um remanescente do choque que originou nosso satélite natural. Essa hipótese diz que um planeta do tamanho de Marte, nomeado de Theia, colidiu com a Terra há cerca de 4,5 bilhões de anos. Os detritos desse impacto teriam formado a Lua.

Segundo o grupo, é possível que o enxofre exótico tenha vindo de Theia, por isso é tão diferente do encontrado em nosso planeta. Após a consolidação do satélite, esse elemento teria se abrigado no manto lunar.

Agora, Dottin acredita que mais estudos do S33 podem encontrar a resposta para a origem desse isótopo. Para o pesquisador, compreender a distribuição desse isótopo dará novas pistas sobre a formação não só da Lua, mas do Sistema Solar inteiro.