Vida em Marte: novas evidências surgem e reforçam possibilidade

Cientistas encontraram novas evidências de que Marte pode ter abrigado vida no passado. Pouco tempo depois do anúncio da NASA sobre a detecção de possível bioassinatura em uma rocha pelo rover Perseverance, um artigo publicado no Journal of Geophysical Research revela que outros pontos da Cratera Jezero – mesmo local da descoberta – também apresentam condições habitáveis semelhantes.

O estudo analisou 24 minerais que registram a história da cratera e mostram como as rochas vulcânicas interagiram com a água. Essas informações ajudam a reconstruir os diferentes ambientes que existiram em Jezero. Embora a pesquisa não tenha examinado diretamente a rocha do Cânion Safira onde os indícios revelados pela NASA há 10 dias foram observados, ela mostra que toda a cratera passou por vários episódios de atividade aquática.

25ª amostra coletada pelo rover Perseverance em Marte, em julho de 2024, de uma rocha batizada de Cânion Safira. Crédito: NASA/JPL-Caltech/ASU

Em um comunicado, Eleanor Moreland, estudante de pós-graduação na Universidade Rice, no Texas, EUA, e principal autora do estudo, disse que “houve várias vezes na história de Marte em que essas rochas vulcânicas específicas interagiram com água líquida e, portanto, mais de uma vez em que esse local hospedou ambientes potencialmente adequados para a vida”.

Algoritmo ajuda a interpretar dados do rover Perseverance

Os dados foram coletados pelo Instrumento Planetário para Litoquímica de Raios X (PIXL) a bordo do Perseverance ao longo de três anos de exploração do rover, que pousou na cratera em em 2021, foram interpretados pelo algoritmo de Identificação Mineral por Estequiometria (MIST) – uma ferramenta desenvolvida na Rice.

Os minerais são como registros naturais, formados em condições específicas de temperatura, química e pH. Em Jezero, segundo Moreland, eles revelam três estágios diferentes de interação entre água e rocha, cada um com implicações distintas para a habitabilidade. Para validar os resultados, os cientistas usaram milhares de simulações estatísticas, semelhantes às aplicadas por meteorologistas para prever furacões.

Visão geral das varreduras do Instrumento Planetário para Litoquímica de Raios X (PIXL) em imagens de algumas das rochas marcianas analisadas. Crédito: Eleanor L. Moreland et. al, 2025.

As rochas mais antigas mostram sinais de fluidos quentes e ácidos, registrados em minerais como greenalita, hisingerita e ferroaluminoceladonita. Essas condições seriam menos favoráveis à vida, já que altas temperaturas e baixo pH podem danificar estruturas biológicas. “Mas na Terra, a vida pode persistir mesmo em ambientes extremos, como as poças de água ácida em Yellowstone, então isso não exclui a possibilidade de habitabilidade”, explica Kirsten Siebach, coautora do estudo.

Episódios posteriores apresentaram águas mais frias e neutras, que formaram minerais como minnesotaíta e clinoptilolita. Essas condições teriam sido mais amigáveis para microrganismos. Os pesquisadores também identificaram sepiolita, um mineral típico de águas alcalinas e frias, considerado altamente hospitaleiro. Sua presença em várias regiões exploradas pelo Perseverance indica um amplo período de habitabilidade.

Moreland explica que Jezero mudou de fluidos quentes e ácidos para águas mais neutras e alcalinas ao longo do tempo, aumentando o potencial de vida. A pesquisa também confirmou blocos vulcânicos como piroxênio, feldspato e olivina, reforçando que o fundo da cratera foi formado por fluxos de lava que depois foram transformados pela água.

Amostras de Marte devem ser analisadas na Terra

Essas descobertas dão contexto a sinais encontrados no Cânion Safira no ano passado, onde a Perseverance detectou indícios de possível vida microbiana antiga, divulgados em uma coletiva de imprensa concedida pela NASA em 10 de setembro e descritos em um artigo publicado no mesmo dia na revista Nature.

Embora explicações não biológicas ainda sejam possíveis, análises futuras em laboratórios na Terra serão necessárias para confirmar a origem orgânica ou mineral dessas evidências.

Rocha intrigante analisada pelo rover Perseverance em Marte que pode conter indícios de vida antiga. Crédito: NASA/JPL-Caltech/ASU/MSSS

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Durante a webconferência, Katie Stack Morgan, cientista do projeto Perseverance no Laboratório de Propulsão a Jato (JPL), da NASA, afirmou que o rover está perto do limite do que pode fazer em Marte. A carga útil do veículo foi planejada para identificar bioassinaturas e coletar amostras para serem analisadas na Terra. Cada tubo armazenado pode conter pistas cruciais sobre vida fora do planeta.

Além de revelar a história mineral de Marte, o algoritmo MIST é fundamental para escolher quais amostras trazer para a Terra. Ele identifica minerais, atribui níveis de confiança e ajuda os cientistas a priorizar as mais relevantes. Esse catálogo detalhado permite focar nas regiões que oferecem os dados mais importantes sobre Jezero.

Dificuldade em trazer o material pode fazer os EUA serem superados pela China

O resgate desse material, no entanto, enfrenta desafios financeiros e técnicos. O programa de Retorno de Amostras de Marte (MSR), da NASA, planejado para 2035, está em revisão devido a cortes de orçamento. Sean Duffy, administrador interino da NASA, disse que a agência busca maneiras mais rápidas e baratas de trazer as amostras, sem detalhar cronogramas ou custos.

Enquanto isso, a China avança com a missão Tianwen-3, que pretende coletar pelo menos 500 gramas de solo e rochas marcianas em 2028 e entregá-las à Terra até 2031. Caso seja bem-sucedida, poderá garantir as primeiras amostras de Marte e ampliar a liderança do país na ciência planetária – fazendo os EUA “comerem poeira”.