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Amostra de gelo revela 12 mil anos de história da Europa

Amostra de gelo revela 12 mil anos de história da Europa

Pesquisadores dataram uma amostra de núcleo de gelo que remonta à última Era Glacial. Preservado no alto dos Alpes, esse material congelado contém traços químicos e partículas atmosféricas que registram 12 mil anos de transformações no clima, na vegetação e na atividade humana na Europa

A amostra é um cilindro de gelo de 40 metros, extraído em 1999 do Monte Branco, montanha que se estende pelos Alpes da França e da Itália. Parte da equipe envolvida na nova pesquisa participou da coleta original e, desde então, o núcleo foi preservado em um freezer.

O período registrado no material congelado data de uma época fundamental para os humanos no continente europeu, abrangendo desde era dos caçadores-coletores até o surgimento da agricultura e da domesticação de animais. 

No cilindro, estão contidas partículas e sais com informações precisas de como o ambiente especificamente da Europa se modificou no decorrer das eras, algo que não ocorre com o gelo coletado em regiões distantes, como o Ártico e a Antártida.

“É emocionante encontrar o primeiro núcleo de gelo dos Alpes Europeus contendo um registro intacto do clima que remonta ao atual período quente de dez mil anos e ao clima muito diferente da última era glacial”, disse a pesquisadora Susanne Preunkert, que foi membro da equipe que coletou o núcleo de gelo nos anos 1990, em um comunicado.

Foto da expedição de 1999, em que a equipe coletou o cilindro de gelo.
Foto da expedição de 1999, em que a equipe do Centro Nacional Francês de Pesquisa Científica coletou o cilindro de gelo. (Imagem: LGGE/OSUG, Bruno Jourdain)

Gelo revela como clima e florestas se modificaram nos últimos 12 milênios

Para o novo estudo, os pesquisadores levaram a amostra ao Laboratório de Núcleos de Gelo do Instituto de Pesquisa do Deserto (DRI) em Nevada, nos Estados Unidos. O material foi examinado com técnicas modernas de análise química, como a medição dos níveis de isótopos de carbono e argônio.

Os resultados, publicados na revista PNAS Nexus, revelam que os verões da Era Glacial eram significativamente mais frios: 3,5 °C a menos nos Alpes e 2 °C em média em toda a Europa Ocidental.

A equipe também analisou as concentrações de fósforo — elemento liberado pela decomposição da matéria orgânica — para determinar como a vegetação mudou nos últimos milênios. As concentrações eram baixas durante a Era Glacial, aumentaram no meio do Holoceno (de 11,7 mil anos atrás até hoje) e diminuíram gradualmente até os dias atuais.

Essa medição indica uma expansão das florestas com o aquecimento do clima, seguida de seu declínio devido à proliferação dos humanos e ao desmatamento para a agricultura e a expansão da indústria.

Pesquisador Nathan Chellman preparando a amostra para as análises no Laboratório de Núcleos de Gelo do DRI. (Imagem: Jessi LeMay)

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O sal marinho contido na amostra também revelou traços do passado. A equipe detectou altas taxas de deposição desse sal durante a última Era Glacial, o que pode ter resultado de ventos mais fortes vindos do oeste para a costa da Europa Ocidental.

Os aerossóis de sal marinho podem espalhar a radiação do sol e afetar o clima ao impactar a formação de nuvens. Ao estudar como eles se depositaram no decorrer dos últimos milênios, o grupo planeja aprimorar os modelos climáticos em uso para entender melhor as mudanças climáticas atuais e futuras.

“Se você realmente vai voltar e examinar todos os estados climáticos possíveis, passados e futuros, precisa de um modelo que capture a verdadeira variabilidade climática. É um objetivo louvável, mas para avaliar a qualidade dos modelos, é preciso compará-los com as observações, certo? E é aí que entram os núcleos de gelo”, disse Joe McConnel, diretor do Laboratório de Núcleos de Gelo do DRI e coautor do estudo.

Agora, a equipe pretende continuar o estudo da história natural preservada no gelo do Monte Branco. O próximo passo será aplicar a datação por radiocarbono para determinar a idade de cada camada congelada. Esse mapeamento poderá revelar novos detalhes sobre as mudanças ambientais ao longo do tempo, e seu impacto no passado e no presente da humanidade.

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