Tarcísio diz que Nayara tentava ‘chamar atenção’ e não teve tempo para acalmar vítima antes da tragédia

Antes do início do depoimento, a defesa sugeriu que o depoimento de Tarcísio fosse dado de forma parcial, sem responder às perguntas do MPAC, que atua como acusação

Após a escuta das 10 testemunhas, o empresário Tarcísio Araújo, indiciado e denunciado pela Polícia Civil e o Ministério Público do Acre (MPAC) por feminicídio no caso da morte da cantora Nayara Vilela, prestou seu depoimento na audiência de instrução que finaliza nesta sexta-feira (9) e aconteceu de forma virtual no Fórum Criminal de Rio Branco.

O MPAC acatou o pedido da Polícia Civil e o denunciou por feminicídio/ Foto: Reprodução

O juiz Alesson Braz, da 2ª Vara do Tribunal do Júri e Auditoria Militar, é o responsável pelo julgamento.

Antes do início do depoimento, a defesa sugeriu que o depoimento de Tarcísio fosse dado de forma parcial, sem responder às perguntas do MPAC, que atua como acusação.

A defesa do empresário pediu ao juiz o direito de “silêncio seletivo” ao acusado, sem responder às perguntas do MPAC, que atua como acusação. O juiz Alesson Braz deferiu o pedido dos advogados.

“Tenho minhas opiniões sobre a questão, mas diante do quadro, defiro o pedido da defesa no sentido de que Tarcísio vai responder apenas às perguntas do juiz e da defesa. Caso queira ficar em silêncio diante das minhas perguntas, passo para a defesa”, disse Alesson.

Tarcísio começou o interrogatório contando como conheceu Nayara e falou sobre a relação dos dois com o ex-companheiro da cantora. Também abordou a situação da posse de armas, crises no casamento e contou como foi a tragédia que resultou na morte da artista.

Confira o que disse Tarcísio no interrogatório:

“Não lembro a data que conheci a Nayara. Ouvi falar que ela cantava. Troquei algumas mensagens. Não lembro a data específica de quando começamos a namorar.”

“A gente se conheceu. O ex-companheiro dela pegou umas conversas novas e expôs na mídia e eu tive que sair de casa. Estava convivendo com minha ex. Depois, começamos a morar juntos. Pedi divórcio e fiz tudo legalizado.”
“Passei mais ou menos 1 mês no escritório. Depois, alugamos um apartamento e fui morar com a Nayara. Ela morava com um companheiro no Vila Acre, não deixou ela tirar as coisas dela, uma coisa assim.”

“A gente alugou um apartamento. Eu ajudei, paguei frete, calção. A mãe dela não pagou nada, não. O ex dela estava muito obcecado, seguia ela. Para evitar brigas, eu evitava ir pra lá, mas depois fui porque não tinha nada a ver.”

Filho de Nayara

“Ele sempre morou com a avó. Opção da Nayara porque ela era assessora, cantava na noite e não tinha tempo. Ele vinha em momentos, no fim de semana, e ficava com a gente lá.”

Como era a relação com Nayara

“No início tudo é um mar de rosas. No início, ela não parava em casa. Tinha a rotina dela e eu tinha a minha. No início era aquele fogo, paixão, início de relacionamento.”

Relação da cantora com os filhos de Tarcísio

“Ela na minha frente aparentava gostar. Tratava o Felipe bem. Toda vez que eu ia ver os meninos, tinha ciúmes, ligava. Achava que ia ver a ex. Mas eu dizia que se quisesse ver ela não tinha saído de casa. Eu evitava pegar os meninos para não gerar discórdia, contenda.”

“Antes de conhecer a Nayara, trabalhava diariamente, quando comecei com ela, fui só uns 30% para evitar ciúmes e tal.”

“A Nayara morava em Sena, chegou aqui de repente. Ficou bem conhecida em Sena. Devido o ex-dela fazer muita coisa errada, pegava dinheiro e não pagava. Gerou uma contenda lá. Ela saiu de Sena às pressas para Rio Branco. O cara que administrava a carreira dela usou o nome dela, deixou um legado de dívidas em Sena. Como fechou as portas lá, veio pra Rio Branco com esse companheiro dela.”

“Quando chegou em Rio Branco, não se apresentou em casa nenhuma. Fechou um carnaval no Quinari, não pagou os músicos. A última apresentação dela com esse companheiro. Não pagou os músicos. Vinculavam o nome dela porque era ela quem estava à frente.”

Quando começaram as brigas

“Não é que ficou ruim. A Nayara estava de boa e de uma hora pra outra. Não sei o que tinha passado. Não gostava de ser contrariada com música, banda. Se alguém contrariasse ela, trazia muito de fora pra casa.”

“Não teve briga, teve discussão, ciúmes por redes sociais, porque eu seguia alguém. A maioria das discussões era por conta de rede sociais. Cheguei a excluir para ter paz.”

“Eu me afastava, porque ela saía do controle quando discutia, me esculachava, e depois pedia desculpa. Eu me isolava, ia pro quarto, pro escritório. Eu pensei: não vai dar, não. Ela falou: se você for, não volte. Liguei pra mãe dela, a Vanusa, contando, quando morava no apartamento. Falei pra mãe dela que estava me retirando. Ela ligou pra ela e disse que eu estava indo embora.”

“Ela se sentia responsável, mandando eu voltar pra minha família. Eu disse que se quisesse voltar, eu estava lá. Ela disse que tinha o sonho de casar. Eu disse: vamos casar. Surgiu do nada, fui organizando as coisas, juntar dinheiro. Estávamos com 6 meses juntos.”

“A Nayara tinha negócio de grandeza, casa grande, com piscina. Pensei que não era justo pagar aluguel. Sempre quis uma casa menor, mas ela queria aquela casa grande.”

Cenas de Nayara “se batendo” e Tarcísio filmando

“Na hora da discussão ela começava a gritar dizendo que ia me expor, ela virava cadeira, eu tinha medo de ela se bater e ficar roxa e colocar a culpa em mim. Eu nunca presenciei ela se batendo. Eu nunca discuti com ela na frente do Jesse (testemunha).”

“Nesse dia da marca roxa na perna, veio uma jornalista e conversou com a Nayara. Amiga da Nayara. Perguntou se podia ficar lá em casa. Elas foram pra piscina e eu fiquei dentro do quarto o dia todo. Elas beberam lá embaixo. No anoitecer ela subiu e disse: só porque trouxe visita tu tá aí. Eu disse que estava indisposto. Quando ela começava a ter crise, se alterava muito, a voz, começava a gritar, discutir. Eu saía para o outro quarto para não ter atrito. Ela ficava batendo na porta. Eu pedia só pra ter paz, pra ela me deixar quieto. Ela puxou meu braço e eu fui pro outro quarto, do nada. E correu em direção à sacada com a intenção de pular, do nada. Eu peguei no braço dela, na sacada, na porta blindex. A mulher subiu e pediu pra ela ter calma. Ela bateu a coxa dela e ficou roxa.”

“Eu chamei ela pra ir ao hospital quando tomou remédios e comprei um carvão ativado para o estômago. Eu chamei pra ir no médico e ela disse que não ia porque iam fazer lavagem. Eu não tenho conhecimento desse dia.”

Ciúmes

“Eu incluía ela em toda minha rotina. Não dava brecha pra ela pensar que eu estava com outra. Ligava em chamada de vídeo. Ela ligava inúmeras vezes. Eu deixei ela no salão e disse pra ela me ligar quando terminasse. Tava lá fazendo umas coisas e tinha três chamadas dela. Do nada, abria o portão e estava lá vendo o que eu estava fazendo.”
“Eu não demonstro. A gente preza. Eu não sou uma pessoa ciumenta. Tem ciúmes de gostar, de cuidar.”

Roupas

“Eu acho que o MPAC pode olhar o Instagram dela. Ela postava foto com roupa curta, decotes e tudo mais. Eu não exigia nada. Todo mundo queria ver ela. Eu deixava, eu poderia dar minha opinião. Nunca proibi ela sair com roupa A, B ou C. Ela gostava quando eu dava minha opinião. Eu nunca proibi. Pode ver no Instagram dela, é público, roupa de academia com decote e tudo.”

“Eu posso ter indagado, criticado. Se fosse assim, ela não ia pra academia. Tem vídeo dançando com roupa de academia.”

Cabelo de Nayara

“Não teve briga por conta de cabelo curto. O que eu falava pra ela é que ela cortava o cabelo dela e ficava com depressão, dizendo que estragou o cabelo. Da última vez ela veio falar, eu disse pra ela nem vir. Eu disse que não ia mais se intrometer, para ele nem vir. Eu dizia pra ela não mexer no cabelo porque toda vez o pessoal tacava química, estragava. Toda vez que mexia no cabelo, passava um mês reclamando.”

“Minha esposa era bonita, maravilhosa.”

“Ela tentava chamar atenção”

“Eu acho que foi tentativa de chamar atenção porque outra vez ela botou a perna na sacada e liguei pra mãe dela. A própria mãe dela disse que ela não ia se jogar”, disse sobre a tentativa dela de se jogar.

“Ela nunca pulou do carro, mas quis abrir. Ela queria chamar atenção. Uma vez ela se trancou no banheiro. Eu achava que ela queria chamar atenção. Ela fazia qualquer coisa pra chamar minha atenção. Até a morte; achei que era pra chamar atenção. Depois a gente fica ligando os fatos. Duas horas depois das crises, ela me abraçava dizendo “meu amor”. Eu não sabia do passado dela. Ela disse em entrevista que tentou suicídio duas vezes. Não era comigo, eu não conhecia ela. Ela contou coisas anteriores sobre a vida dela.”

“Ela disse que foi abusada pelo companheiro da mãe e que a mãe disse que ela estava inventando aquilo para destruir o casamento.”

Mãe de Nayara apaziguava discussões

“Eu sempre ligava e a mãe dela sempre apaziguava, ela ligava também. Mãe dela mandava sossegar várias vezes, quando ela dizia que ia pra Sena. […] Ela chegava do nada e começava a brigar. Eu saía.”

Relacionamentos anteriores

“Ela teve o relacionamento conturbado com esse parceiro dela que enganava ela, gastava o dinheiro dela, mentia pra ele. Ele sim proibia ela de vestir determinada roupa, não deixava dançar no palco, dar autógrafo para os fãs.”

Atendimento psicológico

“Eu que pagava a psicóloga. Fez uns três atendimentos. Ela parou porque a mãe dela determinou. Ela ficou mais agressiva, começou a discutir. A mãe determinou que ela saísse. A mãe dela era da área da saúde e eu não entendia nada de psicologia. Quem mandou ela sair foi a mãe dela. Nunca tive contato com a psicóloga e sim a mãe dela.”

Uso de remédios controlados

“Remédio controlado não. Ela tomava os remédios que a mãe dela trazia de Sena, calmante. A mãe prescrevia e trazia. 99% dos remédios que tinha lá era mandado pela mãe dela. Quem administrava era a mãe dela. Eu não tinha conhecimento do que era pra tomar.”

Posse de arma

“Tinha posse e CAC. Eu guardava em cima do closet. Uma estava em posse, que era de posse, como eu tinha empresa deixava no carro e saía de casa para o trabalho. Algumas vezes transportei porque ela estava cadastrada no endereço do escritório e não da minha casa. Tinha 3 armas cadastradas.”

“Eu deixava no closet, em cima do closet. Ela não tinha visibilidade pra ela. Às vezes, quando eu estava, ficava na cabeceira da cama. É minha segurança, né?”

Pergunta do juiz: Nayara sabia onde as armas estavam?

“Acredito que sabia sim. Uma vez ela pegou na arma no estande de tiro, ela pediu pra pegar. Em casa, nunca pegou na arma. O closet fica no quarto do casal.”

Filho da vítima teve acesso à arma?

“A arma estava na cabeceira, mas estava desmontada nesse dia, numa maletinha. Eu tinha deixado na cabeceira. Ele chegou e perguntou “o que é isso?” e eu disse pra ele não mexer. A mãe dele pediu pra não gritar. Eu disse: claro que tem que gritar. O carregador dela estava na gaveta.”

“Aconteceu um incidente. Eu tava indo pra Sena e o companheiro dela denunciou. Me abordaram dizendo que eu não poderia fazer aquilo, paguei fiança e paguei tudo. Depois disso, deixei de andar com ela. Fui absolvido. Eu estava sendo ameaçado pelo ex dela, tinha boletim, tinha tudo.”

Dia da tragédia

“Almoçamos juntos, ela foi pro salão e a mãe dela foi pra Sena. Toda semana ela ia para o salão. Nesse dia eu estava na Havan e ela no carro. A vó do Levi perguntou se eu poderia pegar o Levi na escola, e eu fui. Parei na Zero Grau e comprei salgados e refrigerantes. Quando estava saindo da Zero Grau, liguei perguntando se ia demorar e perguntei se queria salgado. Ela disse que não e pediu pra eu dar o salgado para o Levi ou pro Marcio, que trabalha comigo. Deixei meu filho na casa dele, depois. Quando cheguei em casa, ela já estava em casa.”

“A princípio ela estava tranquila e começou a me questionar se o Levi tinha celular. Eu disse que não sabia. Começou a perguntar como eu soube que era pra buscar ele, e eu disse que foi pela avó. Pedi pra ela ligar pro Marcio pra saber, se ela quisesse saber. A gente ia viajar na outra semana, viagem de lua de mel.”

“Eu disse que não queria discussão e pedi pra ela ligar para o Marcio para ela saber onde eu estava o dia todo. Aí ela mostrou o cabelo, e eu disse pra ela nem tocar nesse assunto porque sabia o que eu achava. Ela começou a bater na mesa dizendo que não podia falar nada. Ela começou a transtornar, virar a cadeira, como sempre. Para evitar briga, saí do espaço. Disse que eu não valia nada. Falava coisa pra me afetar, dizendo que era bonita e eu era feio.”

“Subi pro nosso quarto. Ela bateu, bateu, dizendo que queria pegar as coisas e ir embora. Eu desci e ela ficou um tempo lá em cima, uns 5 minutos. Desceu e começou a discutir, e eu subi e fechei a porta do quarto e fui tomar banho. Ela batia na porta pra eu abrir.”

“Ela me ameaçou dizendo: “não vão abrir não? olha aqui”. Fui no closet e só tinha duas armas, faltava uma. Procurei ela em todos os lugares, mas não estava, foi quando fui ao banheiro e estava trancada. Abri com chave de fenda. Quando abri ela estava com a arma gravando vídeo. Eu comecei a gravar e mostrar pra mãe dela, que costumava acalmar os ânimos dela nas crises.”

“Ela gravou os vídeos dela. E eu fiz um vídeo pra mostrar pra mãe dela. Eu não me recordo se a arma estava na cabeça dela, eu evito olhar esses vídeos para não causar uma reviravolta. A mãe dela já abriu os vídeos e me ligou, porque a mãe dela ligava pra ela e ela não atendia. Foi tudo muito rápido.”

“Eu abri um pouco da porta e coloquei só braço por dentro para gravar. Eu esperei a mãe dela falar com ela. Ela mandou eu sair e fechou a porta. Abri a porta com chave de fenda duas vezes, na segunda pra mãe dela falar com ela. Ela tava sentada no chão com a arma na cabeça atrás da porta. O diálogo aí foi com ela e a mãe dela. Eu fiquei calado para não instigar. No meio do diálogo, ela tirou a arma da cabeça, botou a arma no peito e atirou. Quando abri, puxei ela pro corredor e tentei fazer os primeiros socorros nela. Ela dizia: “de hoje não passa”.

O senhor chamava ela de “donzela” e tentou de algum jeito acalmá-la?, perguntou o juiz

“Era no sentido de ela querer chamar atenção. Eu falava “amor larga a arma”, mas ela estava transtornada, relutante. Foi tudo rápido. Não teve espaço de tempo para acalmar.”

Juiz pergunta: Depois dos fatos, se envolveu com outra pessoa, viajou?

“Depois, achavam que eu ia me matar. Meu primo me chamou para o Peru. Passei uma semana lá, e eles tentando me alegrar. Viajei só com o Reginaldo. Depois, voltei para Rio Branco e comecei com o psicólogo, 3 vezes por semana.”

“Viajei com amigos para distrair e não namoradas.”

Ideias suicidas

“Eu fui fazer um evento em Sena. Depois da tragédia não tinha feito nada. Vi uma multidão lá e saí de lá, entrei no carro e sumi. Fui na casa da Vanusa (mãe de Nayara). Bateu angústia e depressão. Eu disse que se estivesse armado, tinha tirado minha vida.”

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