O Globo Rural deste domingo (9), foi sobre a Reserva Extrativista Chico Mendes, em Xapuri, no interior do Acre. O programa da emissora carioca aborda questões de agropecuária e produção rural brasileira.
Projeto Mulheres da Borracha visa a valorizar o modo de vida e o trabalho das famílias extrativistas SOS Amazônia/Divulgação
No caso da Reserva Extrativista acreana foi uma longa reportagem sobre mulheres seringueiras que estariam promovendo uma revolução na produção de borracha na Amazônia
De acordo com a reportagem de Luciana Franco, a iniciativa capacita trabalhadoras para que estejam em equidade com os homens em relação a salários, informações, direitos e oportunidades na produção da borracha natural.
O Projeto Mulheres da Borracha visa a valorizar o modo de vida e o trabalho das famílias extrativistas.
“Na Reserva Extrativista Chico Mendes, no Acre, a história de Maria Araújo de Aquino, 59 anos, reflete a resiliência e a luta das mulheres seringueiras. Nascida e criada em Xapuri (AC), Maria vem de uma família de seringueiros, com raízes que remontam à época da Segunda Guerra Mundial, quando seus avós migraram do Nordeste em busca de oportunidades”, diz a reportagem.
“Sempre vivi da borracha, assim como meus pais e avós. A produção enfrentou altos e baixos, especialmente uma crise que perdurou até 2017, época em que o preço da borracha não passava de R$ 1,00 por quilo”, conta.
O programa mostra que, além de seringueira, Maria, esposa do ex-prefeito Júlio Barbosa de Aquino, é diretora da Associação de Moradores da Reserva e membro do Conselho Nacional de Seringueiros.
Nesta condição, ela destaca a importância da organização e da luta pela valorização da borracha. “Trabalhamos para restabelecer o preço da borracha, que é um produto que contribui para a preservação das florestas”, explica.
Maria é uma das seringueiras beneficiadas pelo projeto Mulheres da Borracha, criado pela SOS Amazônia em parceria com a empresa Veja, que produz tênis sustentáveis e o Instituto de Desenvolvimento Social
“Historicamente, as mulheres eram invisibilizadas na produção de borracha. Agora, estamos lutando para que nosso trabalho seja reconhecido e valorizado como protagonistas e não como sombra de nossos companheiros”, diz Maria.
Maria Araújo de Aquino — Foto: SOS Amazônia/Divulgação
O projeto Mulheres da Borracha está alinhado aos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável da ONU para que, até 2030, as mulheres estejam em equidade com os homens em relação a salários, informações, direitos e oportunidades e prevê uma compensação financeira às seringueiras de forma a valorizar o modo de vida e o trabalho das famílias extrativistas.
Por meio dele, além do preço de mercado do quilo da borracha, as produtoras recebem um valor a mais pela prestação de serviços ambientais. Criado em 2019 para contemplar as seringueiras do estado do Acre, em 2024 foi expandido para o Amazonas.
“Foi criado um protocolo de quatro elementos que devem ser valorizados pelas famílias das seringueiras: o cuidado com a floresta, o cuidado com a seringueira, o cuidado com a borracha e a boa relação das famílias com as associações e cooperativas”, conta Gabriela Antonia Sousa, coordenadora do Projeto Mulheres da Borracha, da SOS Amazônia.
Na primeira fase do projeto, realizada entre 2022 a 2023, foram realizadas 40 oficinas comunitárias para mil famílias extrativistas.
“Conseguimos percorrer as unidades de conservação e as áreas também de posse e de outros modelos de modo de produção”, conta Gabriela.
Nessa segunda fase do projeto, entre 2024 a 2025, a expectativa é alcançar cerca de 700 famílias. Nas oficinas são discutidos temas como o modo de vida das produtoras, o papel delas dentro de casa, na família, na sociedade, no meio ambiente, e como isso é refletido na sociedade.
“Mostramos que nos sindicatos e nas cooperativas quase não há mulheres cadastradas e discutimos as estatísticas da comunidade, que mostram que os homens se aposentam pelo trabalho extrativista rural, o que as mulheres não conseguem”, conta Gabriela.
A conscientização tem dado certo. Na primeira fase do projeto no Acre, houve um grande número de mulheres procurando as associações para fazer seu cadastro e entregar produção no seu nome, não só de borracha, mas de outras culturas como açaí e castanha.
Graças às parcerias e políticas públicas, como a Lei Chico Mendes, que garante subvenções e pagamentos por serviços ambientais, o preço da borracha subiu significativamente na região.
Atualmente, os seringueiros em Xapuri podem receber até R$ 23,00 por quilo, um valor que vem mudando a realidade local. “Nos últimos anos, nossa média de produção tem sido entre 150 a 180 toneladas por ano”, conta Maria.
Essa produção é obtida das cerca de 500 famílias cadastradas na Cooperativa Agroextrativista de Xapuri. “Como resultado de nossa luta, a cooperativa não cadastra mais o seringueiro, mas a sim a família seringueira, com o nome dos homens e das mulheres no cadastro”, completa.
A produção de borracha na região é complementada por outras atividades, como a extração de castanha, açaí e café. “É difícil encontrar um produtor que trabalhe apenas com borracha. A diversificação é essencial para a subsistência”, diz Maria.
Nilva da Cunha de Lima é outra importante personagem na produção de borracha. Começou sua jornada aos 8 anos, ajudando o pai nos seringais. “Depois de morar um período na cidade, voltei para a região com a certeza de que poderia contribuir com a produção e com a comunidade”, afirma Nilva, que é presidente da Cooperativa da Associação do Assentamento em Capixaba, município no sudeste do Acre.
Desde a sua fundação, há cinco anos, a cooperativa passou de apenas duas mulheres seringueiras para 25 afiliadas, um sinal claro do crescente protagonismo feminino na atividade. “Com oficinas e capacitações mostramos que as mulheres podem e devem assumir papéis de liderança na produção”, destaca Nilva.
Nilva da Cunha de Lima — Foto: SOS Amazônia/Divulgação
A cooperativa produziu 60 toneladas de borracha em 2024. Ambas as líderes reconhecem que, apesar dos avanços, ainda há um longo caminho a percorrer. Com a crescente valorização da borracha e o empoderamento das mulheres, a esperança das seringueiras é que a atividade extrativista continue a prosperar, garantindo um futuro sustentável para as próximas gerações.
Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram que em 2023 a produção de borracha no Brasil somou 463 mil toneladas. Deste total, 1.058 foram produzidos nos estados da Amazônia Legal, de acordo com a Fundação de Apoio e Desenvolvimento ao Ensino, Pesquisa e Extensão Universitária do Acre (Fundape). Embora o volume seja pequeno, ele vem crescendo nos últimos três anos.