Mato Grosso, segundo estado com mais desmatamento na Amazônia, aprova PEC que limita a criação de novos parques ambientais

Governo defende que só pode criar novas Unidades de Conservação quando as atuais forem regularizadas; ambientalistas apontam inconstitucionalidade

Os deputados do Mato Grosso aprovaram nesta quarta (11) uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que limita a criação de novos parques ambientais no estado. A PEC 12/22 é de autoria do próprio governo estadual, cuja administração vem enfileirando polêmicas medidas de flexibilização ambiental, conforme mostrou O GLOBO. Agora, o Mato Grosso só poderá voltar a ter novas Unidades de Conservação (UCs) quando 80% das atuais 47 unidades estiverem devidamente regularizadas, em um prazo estimado em pelo menos 10 anos.

O argumento do governo de Mauro Mendes (União Brasil), ao enviar a PEC, foi de que apenas 7,3% dos 2,8 milhões de hectares de floresta protegida no estado teve sua regularização fundiária concluída. E, para que o restante fosse regularizado, haveria muitos gastos financeiros. Já ambientalistas contra a PEC argumentam que não é necessário orçamento para criação de novas UCs e que o texto é inconstitucional, por interferir em área de atuação da União.

Nesta quinta, o governo do Mato Grosso, em seu site, celebrou a aprovação da PEC, que “regulariza a criação de novos parques estaduais”. Ambientalistas criticam que as condicionantes obrigatórias do texto vão colocar um limite muito longo para que novas UCs sejam criadas. Além de obrigar a regularização de 80% das UCs existentes hoje, a PEC traz a obrigatoriedade de “disponibilidade de orçamento” para que se paguem as indenizações a proprietários, que seriam os donos de terras nas florestas a serem desapropriadas.

E PEC ainda muda o prazo para início da indenização para daqui a 10 anos. Ou seja, o governo passa a ter 10 anos para começar a regularizar essas UCs. Assim, o alcance do índice de 80% está em um horizonte distante.

Consultora do Observatório Socioambiental de Mato Grosso, Edilene Fernandes do Amaral critica o argumento do governo sobre a regularização fundiária das UCs.

— Isso é uma caixa preta. Quem tem acesso a esses dados? Nem o governo porque não tem levantamento fundiários das UCs para saber a real situação, pelo não disponibilizadas ao público ou mesmo ao Conselhos das UCs. Existem regras jurídicas para indenizações e isso leva a um levantamento fundiários desde a criação da UC para diferenciar proprietários ou possuidores legítimos de invasores e posseiros — explica Amaral.

Um ponto destacado pelo governo estadual é que PEC autoriza o estado a receber recursos financeiros, de ONGs ambientais ou de entidades públicas ou privadas, sejam elas nacionais ou internacionais, para ajudar na criação e manutenção das unidades de conservação.

Acusação de inconstitucionalidade

Em nota técnica, o Fórum Popular Socioambiental de Mato Grosso (Formad) e o Observatório Socioambiental de Mato Grosso (Observa MT) afirmam que a PEC é inconstitucional por uma série de motivos, como por exemplo interferir na “competência privativa da União para legislar sobre os requisitos de criação de Unidades de Conservação”, propondo uma lei menos protetiva do que a Constituição Federal, o que não é permitido, segundo jurisprudência do STF.

Além disso, os pesquisadores que assinam a nota técnica argumentam que a disposição de orçamento para regularização fundiária não é requisito para criação de Unidades de Conservação. A dotação só é necessária quando a UC for implementada, mas não impede a edição de decreto de criação, explicam.

“Mesmo que houvesse a alegada escassez de recursos, não se pode cercear direito fundamental sob tal pretexto, posto que a frustração de direitos previstos na Constituição Federal não pode ser justificada sob o fundamento da insuficiência orçamentária”, diz trecho da nota técnica.

Os pesquisadores ainda apontam a falta de transparência sobre o uso de recursos ambientais no estado e destacam que a PEC não foi embasada por estudos técnicos e também não teve participação popular.

Alta de queimadas e desmatamento

Desde o início do ano, já houve 50.343 focos de queimada, ou 18,5% do total do Brasil, no Mato Grosso, segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). A estatística coloca o estado como o segundo com mais queimadas no país, atrás apenas do Pará. Único estado do país que reúne três biomas — Cerrado, Pantanal e Amazônia —, o Mato Grosso é uma importante fronteira do desmatamento, principalmente pela pressão do agronegócio.

Os números de queimadas são semelhantes ao de desmatamento. Segundo o sistema DETER, do Inpe, o Mato Grosso também é superado apenas pelo Pará no total de área desmatada no ano: 920 km2.

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