Monitoramento de cetáceos em risco nas áreas afetadas pela catástrofe de Mariana

Ongs e cientistas alertam que espécies podem ser extintas, mas a Fundação Renova afirma que o acompanhamento prossegue

Considerado o maior desastre ambiental da história brasileira, o rompimento da barragem de Fundão, no interior do município de Mariana (MG), em novembro de 2015, causa prejuízos até hoje.

Vistoria realizada pelo Ibama em julho de 2016 no trecho atingido pelo rompimento da barragem de rejeitos da mineradora Samarco, em Mariana, Minas Gerais. Foto: Felipe Werneck/Ibama

O colossal despejo de 40 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério afetou 39 municípios, em Minas Gerais e no Espírito Santo, e matou 118 pessoas, aponta a Cáritas.

Além disso, a poluição que desceu por mais de 600 km do Rio Doce chegou ao Atlântico, ameaçando a biodiversidade costeiro-marinha. Chuvas fortes jogam mais contaminantes acumulados no manancial.

A lista inclui uma população isolada da toninha (Pontoporia blainvillei), no norte do Espírito Santo. Parente das baleias e golfinhos, a espécie é o cetáceo sob maior ameaça de extinção no Atlântico Sul.

A grande mancha tóxica do desastre de Mariana quando chegou ao Atlântico. Foto: Fred Loureiro / Secom/ES.

Bancado pela Fundação Renova, o monitoramento executado por instituições públicas e particulares mostra ambientes e animais contaminados com arsênico, cromo e outros “metais pesados”.

A entidade foi criada em 2016, quando as empresas Samarco, Vale e BHP assinaram um acordo judicial para reparar os estragos socioambientais causados pela tragédia.

Absorvidas pelos organismos, essas substâncias provocam danos neurológicos, cardiovasculares, infecções, deformações e outros problemas de saúde.

“Isso afeta a fauna de maneira ampla e variada”, diz Eduardo Camargo, coordenador do projeto Baleia Jubarte. “E os cetáceos são os únicos mamíferos monitorados”, alerta. A iniciativa, contudo, estaria ameaçada.

Lesões como a dessa tartaruga, no Espírito Santo, não eram registradas antes do rompimento da barragem de Mariana, afirmam cientistas. Foto: PMBA/Fest/Divulgação

Segundo Camargo, a Renova “quer retirar toda a parte de saúde dos cetáceos” do financiamento. “Pode ter um aditivo enquanto não é aprovado um novo plano de trabalho”, diz.

Professor e pesquisador na Universidade Estadual do Norte Fluminense, Leonardo Serafim da Silveira atua há duas décadas na região atingida pelo desastre de Mariana.

Para ele, manter o monitoramento é fundamental para que sejam identificados impactos contínuos à biodiversidade e meios de conservação. “A cada ano que passa a possibilidade de consequências aumenta”, reforça.

Silveira descreve que especialmente as toninhas apresentam lesões ósseas e sanguíneas, em órgãos internos como pulmões e rins. “Isso pode afetar a reprodução e extinguir aquela população local”, avisa.

Mas, os prejuízos podem ser ainda maiores. Espécies valiosas para a pesca e o turismo também são vítimas potenciais. “Pessoas podem estar comendo peixe contaminado. O risco é grande para todo o ecossistemas”, alerta o cientista.

Programa renovado

Consultada pela reportagem, a Fundação Renova afirma que um novo formato do Programa de Monitoramento da Biodiversidade Aquática (PMBA) foi aprovado este ano e inclui estudos de cetáceos, com mudanças “da malha amostral, da frequência amostral e matrizes analisadas” para “o acompanhamento de tendências sobre as comunidades bióticas e seus ecossistemas na região dulcícola, foz e área costeira e marinha”.

Além disso, a empresa descreve que, para o monitoramento da biodiversidade no Espírito Santo, firmou um acordo de cooperação técnico-científica de R$ 696,5 milhões com a Fundação Espírito Santense de Tecnologia (Fest).

“Uma rede de pesquisadores gera uma ampla gama de resultados, fornecendo subsídios para o planejamento das ações de reparação da biodiversidade. Seus resultados devem ser interpretados com cautela e integrados a outros estudos para preencher lacunas de conhecimento”, diz a Renova.

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